12/10/81 – Programa “Ponto de vista”
Coordenador: Nelson Araujo – repórter
Debatedores: Luiz Lacerda Biagi e Fernando Homem de Molo
APRESENTAÇÃO: Nelson Araújo:
̶ “Um problema sério que mexe com cada um de nós: o problema da energia. É claro que o problema é da dívida externa, aparentemente é mais preocupante. Mas você vai ver que, por trás dessa cifra assombrosa de 60 bilhões de dólares que o Brasil deve aos bancos e órgãos financeiros internacionais, está justamente a questão da dependência energética. Uma situação que incomoda a maioria dos países ocidentais que, como o Brasil, basearam seu desenvolvimento sobre uma coisa que não tinham: o petróleo, que, em 1973 pra cá, custa caro. Todos nós estamos pagando muito caro por isso.
O Brasil, por exemplo, gasta hoje, certa de 10 bilhões de dólares por ano só para comprar petróleo. E chegamos a um ponto crítico tal que nos obriga a pedir empréstimos para pagar os juros de empréstimos feitos anteriormente e evidentemente fazer novos empréstimos para comprar mais petróleo, alimentando, sem parar, essa bola de neve chamada dívida externa.
Para tentar sair dessa dependência, o governo brasileiro há seis anos vem tentando descobrir fontes alternativas e renováveis de energia. Criou alguns programas que poderiam resolver parte do problema, mas que exigem investimentos altíssimos.
Um desses programas, talvez o principal, é o Proálcool, cujo desenvolvimento afetou e vai afetar muito a região de Ribeirão Preto, que hoje tem perto de 220 mil alqueires plantados com cana de açúcar, a matéria prima do Proálcool.
Muito badalado a princípio, visto até como um possível “salvador da Pátria” o Proálcool não anda rendendo o que se esperava, e, agora passa até por momentos de instabilidade. Na opinião dos senhores, o Proálcool, e de um modo geral, esses programas alternativos do governo vão resolver alguma coisa?
LUIS LACERDA BIAGI: “ ̶ Na minha opinião, o Proálcool vai resolver parcialmente. Vai ajudar a resolver o problema associado ao petróleo, à hidrelétricas e à exploração do carvão, no Brasil.
COORDENADOR: ̶ “Luis Lacerda Biagi, de 37 anos. Diplomado em Ciências Econômicas pela Mackenzie, Luis Biagi é empresário. Participa na condição de presidente, vice-presidente e sócio gerente e diretor de várias empresas nacionais ligadas principalmente ao setor da indústria do açúcar e álcool e de equipamentos pesados. Já fez 52 viagens de estudos ao exterior e frequentemente participa de congressos sobre o álcool como fonte alternativa. Já fez muitas palestras sobre as alternativas energéticas do País e participou da elaboração de um dos estudos que deu origem ao Proálcool.
COORDENADOR: ̶ “Antes da gente começar a discutir com profundidade o Proálcool e outros programas alternativos de energia do governo, seria interessante fazer uma retrospectiva.
TV: ̶ Biagi, na sua opinião, quais as razões, quais os motivos que levaram o Brasil a estar nessa situação de hoje, com relação à dependência energética?
L.L.B: “ O Brasil logicamente se fundamentou numa tése que outros países também se fundamentaram, neste aspecto nós não erramos sozinhos, e se baseou, como disse bem o Fernando, o transporte baseado no petróleo. J. técnicos vinham alertando nesse aspecto, já que em 1931, quando o Instituto de Engenharia do Rio de Janeiro fez um simpósio sobre problemas futuros de energia no Brasil. A conclusão do simpósio, foi de que o governo brasileiro deveria procurar petróleo na Bacia de Campos, desenvolver a extração do carvão no Sul, e também, usar álcool como mistura carburante. Naquele tempo, já tinha surgido em Alagoas, a Usina Serra Grande, que lançou um álcool chamado Usga em 1929 e que chegou a acionar 700 veículos na região do Recife. Quer dizer: nós estamos aqui iniciando um debate com 50 anos de atraso.
TV: ̶ “Quer dizer que, na sua opinião, houve algum erro do governo, das autoridades, em privilegiar determinados setores e não outros.”
L.L.B: “Sem dúvida. Eu acredito que o consumo de energia primária no Brasil, o consumo conhecido, tem uma dependência de 42%. Quer dizer, o total de energia no Brasil, 42% se baseia no petróleo. E as reservas energéticas brasileiras, o petróleo está estimado em 2,3%, das reservas energéticas totais brasileiras, sendo o carvão brasileiro com 75,8%, das nossas reservas energéticas. Nesse aspecto então, nós sabedores que éramos e que somos da escassez de petróleo no País, apesar dos processos que vem sendo realizados e do estímulo à prospecção que vem sendo dada a Petrobrás, nós temos uma dependência que, no global, para o telespectador entender, nós consumimos um total de energia primária de aproximadamente 900 milhões de barris por ano, dos quais 42% são derivados de petróleo. Então nós estamos realmente, nos baseando em produto escasso e finito.
TV: Você, Luis, acredita que no Brasil há lençóis petrolíferos capazes de atender à nossa demanda ?
L.L.B: “Realmente ninguém pode dizer. Inclusive eu sempre estranho muito uma afirmação de que parece que o petróleo está terminando, porque se nós ainda estamos procurando e não sabemos aonde ele está, é muito difícil, realmente, determinar quando ele vai terminar. Agora, o risco que existe no Brasil encontrar petróleo, é um risco muito sério. Porque, se o Brasil encontrar petróleo, o Brasil vai ficar rico, ficando rico, nós não vamos poder atribuir às multinacionais, aos árabes, as nossas limitações de desenvolvimento.”
TV: Luis, você participou de uma equipe de estudiosos que fizeram um programa alternativo, se não me engano é “Fotossíntese como fonte alternativa” e esse programa ajudou, como dissemos na abertura deste programa, inspirou a criação do Proálcool. E nesse estudo que vocês fizeram não foram consideradas essas observações que o Fernando acaba de fazer?
L.L.B: “Bem. Nós tivemos a preocupação na época, em 1974, de levar esse estudo ao General Araken e posteriormente esse trabalho foi levado ao presidente Geisel, que determinou a criação, segundo os seus assessores mais chegados, uma decisão quase que unilateral, em que ele determinou que o Programa Nacional do Álcool fosse criado. Nesse trabalho propõe-se a substituição da gasolina pelo álcool e também do óleo diesel. Evidentemente que seria mais importante que, no primeiro momento, nós tivéssemos atacado a substituição do transporte coletivo, que nós tivéssemos atacado pelo diesel, que é a fração mais difícil. Isso não foi possível por razões de interesse da indústria automobilística que precisava, naquele momento, valorizar a continuidade da produção de veículos. E assim foi determinada a produção de veículos a álcool. Mas o certo teria sido, produção de caminhões, tratores, ônibus movido 100% a álcool para a substituição do diesele a substituição do diesel Ciclo Otto. Esse é um aspecto importante que eu queria ressaltar nesse trabalho e voltarei a comentar.
TV: O governador Paulo Maluf está perfurando. Que chances, na sua opinião, ele tem de encontrar petróleo ?
L.L.B: O governador é um homem de sorte. Um homem de sorte. Ele tem conseguido muitas coisas durante esses anos. Na minha opinião particular eu acho que as chances do governador encontrar petróleo são mínimas.
TV: Quer dizer que você, Fernando, acha que há outras soluções que não seja a do Proálcool? Você concorda com isso, Luis ?
L.L.B: ̶ Eu concordo. Eu queria mencionar um fato que foi elaborado pelo governo um trabalho de “Política Energética Brasileira”. Esse trabalho foi elaborado pelos assessores do ministro Cesar Cals e esse trabalho preconiza um programa para a substituição do petróleo previsto para 1985. Em 1985 existe uma previsão de nós consumirmos 1 milhão e 500 mil barris de petróleo por dia, que deveriam ser substituídos da seguinte forma: o álcool contribuindo com 150 mil barris desse milhão e meio de barris. Quer dizer, o álcool contribuiria com 10% das necessidades de petróleo, em 1985. São as metas do governo estabelecidas por esse trabalho elaborado pelo Ministério de Minas e Energia. O carvão mineral com 170 mil barris, o carvão vegetal com 120 mil barris, o xisto com 25 mil barris, o que é muito pouco, fontes alternativas outras menores, com menores participações, com 15 mil barris e o petróleo nacional com 500 mil barris. A proposta do governo é no sentido dessa associação de alternativas para a redução da dependência. Nós então teríamos, naquele momento, uma dependência de petróleo, da ordem de 35%, quando hoje a nossa dependência de petróleo é da ordem de 75%. Mas já tivemos a dependência próxima de 90%. Quer dizer. Nós temos que considerar que evoluímos bastante durante estes últimos anos, evidentemente nem sempre no caminho mais conveniente, de determinadas pressões que o governo sofre, de grupos interessados em se beneficiar, evidentemente desse programa.
TV: Nos parece que o Luis Biagi tem uma posição diferente dessa daí, de Fernando.
L.L.B: “Perfeito. Eu gostaria de comentar que a Petrobrás, nesse estudo que ela elaborou, se esqueceu de considerar uma série de aspectos fundamentais o que induziu o Fernando, na minha opinião, a um erro de análise, porque a Petrobrás deixou de considerar uma série de aspectos muito importantes. O mais importante deles, talvez, seja o aspecto de que, no Brasil, nós moemos anualmente 145 milhões de toneladas de cana. É importante mencionar que, se nós entrássemos hoje, numa economia de guerra, e não produzíssemos açúcar nem para exportar, nem para consumo interno, quer dizer, numa economia eminentemente de guerra, nós já temos cana plantada hoje, para acionar toda a frota de veículos existente no país. Essa quantidade de cana convertida, somente em álcool, já produz da ordem de 11 bilhões de litros de álcool. Essa quantidade de 145 bilhões de toneladas de cana, ela produz, a 13% de fibra. Isso, para das ideia ao telespectador, equivale a 40% de todo o combustível consumido no País. Equivale a 45% do total da capacidade energética instalada na hidrelétrica de Furnas. A Petrobrás também, não considerou, nesse trabalho que fez, o confisco, porque se o álcool custasse 60 cruzeiros, as usinas não teriam condição de sobrevivência, já que atualmente as usinas e destilarias autônomas, com esse preço considerado exorbitante, 48 cruzeiros por litro de álcool vendido ao sistema Petrobrás, e esse álcool, vestido de gasolina é colocado ao consumidor por 85 cruzeiros por litro. E cada litro, para o sistema do governo, o produtor deixa 43 cruzeiros. Ele recebe 48 cruzeiros pela produção, pelo plantio, pelo transporte, e essa álcool depois, misturado na gasolina, álcool anidro, é vendido ao consumidor por 85 cruzeiros. Isso está deixando aos cofres, anualmente, o confisco do setor, que como um todo no Brasil produz anualmente, entre cana, açúcar, vinhaça (que é aplicada como resíduo fertilizante), da ordem de um trilhão de dólares. É a produção do setor como um todo. Desse total é confiscado, pelo governo, através de retenções na exportação do açúcar, em retenções de preço na venda do álcool misturado na gasolina, aproximadamente 2 bilhões de dólares por ano. Esse setor está deixando para os cofres públicos, aproximadamente dois bilhões de dólares por ano.
TV: Quer dizer: Quatro vezes mais do que o governador pretende, o governador de São Paulo pretende negociar com os japoneses?
LLB – Perfeito.
TV: Mas você Luiz fez uma afirmação, me parece que, um defensor fervoroso do Proálcool, e acha que o Proálcool é medida viável, mais rentável e mais fácil para substituir o Petróleo.
LLB – Não. Eu diria que o Proálcool, sozinho não pode fazer nada. O Proálcool sozinho não teria condições de resolver o problema energético, porque no Brasil nós sempre temos um programa que vai ser a salvação do País. O Proálcool já passou de moda, agora é Carajás que “vai salvar o Brasil”. E sempre exige uma explicação das dificuldades que nós estamos vivendo, principalmente para uma justificativa para a inflação, que há bem pouco tempo era o petróleo, agora o petróleo teve seus preços estabilizados e até reduzidos, como no caso do Iraque. Então agora, os causadores da inflação são os banqueiros. Então sempre existe um programa que será a nossa salvação e sempre existe um problema que explica os prognósticos do governo.
Agora eu acho que a associação do álcool, com o carvão, com as usinas hidroelétricas que produzem, (realmente um potencial hidroelétrico no Brasil é da ordem de 250 milhões de KW – potencial existente) e nós temos instalados da ordem de 35 milhões de KW.
TV: Luiz o Governo estabeleceu uma meta de produzir 10 bilhões de litros de álcool até 1985. Você acha possível cumprir essa meta?
Bem, eu, antes de falar sobre a meta de 85, eu gostaria de fazer um comentário com relação ao custo da Petrobras. A Petrobras tem uma estrutura do preço da gasolina que é base de um negócio totalmente desconhecido do público que se chama “dólar-petróleo”. No Brasil, existe no Banco Central, uma conta que é o dólar-petróleo. Se o dólar para você, público, custa 116 cruzeiros, para a Petrobras comprar petróleo no exterior, custa 85 cruzeiros. Existe então, um grande subsídio à Petrobras, para que ela adquira petróleo do exterior, e, com isso conseguido, numa estrutura de preços da gasolina, antes do último aumento, a Petrobras conseguia chegar, efetivamente, num preço de petróleo bruto a 22 cruzeiros, o processamento era 1,64, o preço médio da realização era 23,70, depois entra a conta-petróleo 15 cruzeiros, o lucro da Petrobras 11,30 cruzeiros, preço da realização de 50 cruzeiros; e ai depois vem uma série de impostos, de alíquotas, alíneas, PIS, PASEP, cota da Previdência Social, alíquota de distribuição, margem da revenda no posto, chegava naquele 75 agora nos 85 cruzeiros. O fato muito importante é que o Banco Central banca uma diferença muito superior do que é bancado para o álcool, com relação à produção de petróleo. Com relação às metas de 1985 eu teria a dizer o seguinte: foram aprovados 382 projetos até a data de hoje. Existe, no momento em compasso de espera, na Comissão Executiva Nacional de Álcool que vem preocupando imensamente toda a classe empresarial, porque desde o mês de junho último, não foi aprovado nenhum projeto. Os 383 que já foram aprovados, deverão produzir da ordem de 8 bilhões de litros em 1985. Então está faltando aprovação da ordem de 2,7 bilhões de litros, para atingirmos a meta. E este ano, muitos empresários já perderam o ano agrícola, deixaram de plantar, porque seus projetos não foram aprovados em tempo hábil e, é também importante comentar para o telespectador, que desde 1975 até hoje, desses 382 projetos aprovados, foram liberados, n a parte industrial, até hoje, o total de todas as liberações de todos os bancos e agentes, do Banco do Brasil, BNDE, BNB e os bancos de desenvolvimento estaduais 60 bilhões de cruzeiros, que é uma soma irrisória, em se considerando que nós passamos de uma produção de 500 milhões de litros de álcool/ano em 75, para 4,3 bilhões de litros de álcool este ano. Realmente o assunto e polêmico. Eu também quero retificar data que você comentou Araujo, me parece que a Petrobras foi fundada em 1953, pro meio da Lei 2.004, que deu o monopólio da prospecção e da produção à Petrobras no Brasil.
TV: Luiz agora pouco você afirmou que, provavelmente não será alcançada a meta de 10,7 bilhões de litros de álcool que o governo estabeleceu para 85. Vai ficar ai em torno de 8 bilhões. E haverá consumo para ele? Esses 8 bilhões? Eu te pergunto antecipadamente, os carros a álcool estão consumindo a quantidade de álcool que as usinas e destilarias estão produzindo?
LLB: hoje no Brasil existe um consumo médio da ordem de 2 mil litros carro/ano. É o consumo médio de combustível. Esses números são assim aproximados, e a gente obtém em diversas áreas do governo. Previa-se, no protocolo assinado entre o governo e a ANFAVEA, a produção até 1985, de 2.461.000 veículos 100% movidos a álcool. Nós teríamos então, uma distribuição de álcool misturado na gasolina, o álcool anidro, de 3.2 bilhões de litros; nós teríamos o álcool hidratado, para consumo direto, nesses veículos naquela data de 6 bilhões de litros, para alcoolquímica, uma dotação de 1,5 bilhões de litros. Isso tudo em 1985. Com a redução da produção de álcool naquela data e, consequentemente com a redução de produção de veículos a álcool ̶ e é bom que se diga que com relação aos problemas de veículos, eu coloco um ponto polêmico, com relação aos veículos a álcool ̶ se um fabricante de veículos colocasse em circulação veículos a álcool que fizesse 25 quilômetros com um litro de álcool, ele teria muita dificuldade, porque encalharia a produção de veículos a gasolina. Quero dizer, para a indústria automobilística é muito difícil fazer o marketing em cima de dois combustíveis. Seria muito importante caminharmos para um único combustível. E este é um aspecto que me parece muito importante.
TV: Luiz, em sua opinião, porque não foi desenvolvido até agora um motor que funcionasse bem com álcool, que fizesse economia. E mais, porque o álcool não foi estudado como combustível para substituir o diesel, para tocar caminhão, ônibus, e principalmente, para substituir o óleo combustível nas indústrias, onde é que o país mais gasta com petróleo. Eu também gostaria de saber sobre os critérios adotados na política de pesquisa tecnológica do País. Porque a indústria automobilística encomendou, conforme uma publicação recente, uma pesquisa para a Usiminas. Eles queriam construir um motor que ficasse imune à alta corrosão provocada pelo álcool. Depois de 18 meses eles conseguiram descobrir um aço melhor do que o que ela já fabricava, mas descobriu um álcool que não é corrosivo, e isso poderia ter sido descoberto bem anteriormente, pelas destilarias, pelas usinas de açúcar.
LLB: Sem dúvida, a Usiminas, com isso está dando uma contribuição muito importante, porque ela mostrou uma capacidade técnica grande, ao, não podendo prover a indústria automobilística com uma matéria-prima requerida, ela estudou a possibilidade de neutralizar o álcool, e com isso, conseguindo também um provável barateamento na construção de destilarias ̶ eventualmente a coluna C poderia ser de aço carbono. É realmente uma contribuição expressiva da Usiminas, e isso demonstra que nós, no Brasil, temos uma vocação natural para esse campo. Eu acho que, nós devemos no Brasil, seguir a nossa vocação energética, que é, realmente usinas hidrelétricas, aqueles aspectos que já falei, o carvão, o petróleo evidentemente, e o álcool. E o risco que nós corremos e de achar petróleo e ficarmos ricos.
TV: Quer dizer; a sua opinião, pergunta que fiz anteriormente, sobre a ausência desse motor bem feito, movido à álcool é porque o álcool ainda não consegue, não inventaram uma coisa sobre o problema álcool, capaz de substituir o diesel e o combustível.
LLB – A gente poderia dizer que o álcool é um combustível tão excepcional eu ele toca motor a gasolina. Raramente você vai encontrar na história um combustível que acione um motor projetado para outro combustível. Porque na realidade o que a indústria automobilística fez, até hoje, foi adaptar precariamente, no início inclusive, os seus motores para utilização de álcool, não tendo ainda um motor projetado e desenvolvido para funcionar 100% a álcool. Agora, a principal razão de mal funcionamento também é causado pela mistura de água no álcool pelos postos de gasolina, porque a atração é muito grande, colocar água da torneira no álcool e vender por 52 cruzeiros.
TV: Os próprios postos fazem isso?
É fazem isso e nós temos feito diversos testes, evidentemente eu não quero aqui acusar todos os postos, eu acho que a gente deve mencionar que existe, e eu comprovei em diversos postos pessoalmente, em que o carro vinha funcionando bem com o álcool colocado na destilaria e, sendo abastecido no posto passava a funcionar pessimamente, pelo excesso de água contido no álcool. Cabe agora às distribuidoras resolver esse problema, através de um eventual tipo de coloração, ou eventual densímetro, de alguma forma que possa dar ao consumidor a certeza, a segurança de que ele está colocando o álcool puro, e não o álcool com água, Esse seja, talvez no momento, o maior problema do carro 100% a álcool.
TV: Estaria aí, em sua opinião, uma das razões do descontentamento, do descrédito no carro a álcool.
LLB: Eu acredito que essa é a principal razão, associada a uma adaptação intempestiva, muito rápida, feita pela indústria automobilística, realmente que não satisfez.
TV: Luiz, com relação a área agrícola, se esse ritmo for mantido, tendendo para o lado negativo, o que pode acontecer, levando em consideração, inclusive que em certas regiões do Brasil, principalmente a região Centro-Sul, hoje, está vendo até um pouco assustada, o avanço que muitos críticos chamam de perigoso, das plantações de cana.
LLB: Nós temos uma área agricultável, terras de boas condições no Brasil, da ordem de 250 milhões de hectares, dos quais nós plantamos apenas 50 milhões de hectares. Todos nós conhecemos o ditado popular de que quem nunca comeu doce, quando come se lambuza, então a grande preocupação que nós temos no Brasil e eu sempre observo isto, é quando nós estamos produzindo. Quando nós estamos produzindo, temos um consumo tão baixo, nós estamos num País tão pobre, que quando produzimos um pouco mais, nós não temos consumo. O grande problema do País se formos ao fundo do problema, é o problema do poder aquisitivo baixíssimo, uma população paupérrima, marginalizada, e aí, então, entrariam outras teses, outros pontos de vista, inclusive o do controle da natalidade, que seria talvez o grande programa do futuro, o Brasil, talvez ainda, nunca houve o debate. Eu acredito que esses 250 milhões de hectares, existe um campo para desenvolvimento. Basta dizer que, o Dira de Ribeirão Preto produz aproximadamente de 8 % a 10% do total de alimentos produzidos no Brasil. Ora, se ele é “um mar de cana” como todo mundo atribui, se produz de 8% a 10% do total de alimentos do Brasil, isto quer dizer o que? Que Ribeirão Preto produz? Não. Quer dizer que o Brasil produz pouco, não produz nada. Quer dizer é exatamente isso. Nós temos que plantar e sempre temos visto que a carência beneficia a polêmica, beneficia as teses, e quando há sobra, existe uma revolta que parece que é maior. Parece que estamos fadados à carência, à necessidade, para podermos justificar a nossa própria incompetência de criar riqueza e um povo que possa realmente consumir.
TV: Eu gostaria até de adicionar a discussão uma pesquisa recente afirmando que a produção de hortigranjeiros do Estado de São Paulo, caiu também, assustadoramente. Mas você, Luiz, parecer que não se preocupa com esse tipo de perigo que a cana pode representar para a produção de alimentos, não é?
LLB: Bom. Eu acredito o seguinte: que a cana forma o empresário agrícola. Hoje a Copercana, por exemplo, de Sertãozinho possui 42 mil associados. É uma cooperativa de pequenos produtores. E a Copercana, nos últimos anos tem vendido uma quantidade muito grande de diversos tipos de semente para ̶ Eu até tenho esse dado, comigo ̶ a Copercana chegou a vender durante o ano passado, um milhão de quilos de sementes de amendoim e um milhão de quilos de semente de soja, plantados por esses 42 mil associados. No Brasil, nós temos 42 mil fornecedores, aproximadamente 100 mil caminhões, 5 mil máquinas agrícolas. Evidentemente 100 mil caminhões e 5 mil máquinas agrícolas estão preparadas para, numa economia de mercado, e eu sempre defendi a tese de economia de mercado, acho que o governo ao tentar, eventualmente, dirigir ele comete o erro de induzir, e, na economia de mercado, quando falta alimento, é natural que muitos agricultores vão plantar aquele produto, até que haja superprodução e o preço caia. É a lei da oferta e da procura e que não vendo sendo praticada no País. Sendo o empresário direcionado e ao ser direcionado ou recebendo diretamente subsídios para uma determinada cultura, ele realmente prejudica a economia. Mas isto é uma postura de Governo, porque se o Governo deixar que a lei da oferta e da procura funcione, nós teremos uma tendência de equilíbrio, que é o natural no tipo de regime de livre iniciativa em economia de mercado.
TV: O empresário vive sempre a procurar, o que é óbvio, o que sempre dá mais lucro.
LLB – Pois é, você vê que o pavor que se tinha, o receito que tinha de Serra Pelada, Serra Pelada chegou a ameaçar o IBOPE do Proálcool. Depois caiu e foi superada francamente por CARAJAS. Mas, em termos de IBOPE, Serra Pelada chegou a ameaçar, e todo mundo vai para Serra Pelada tentar conseguir ouro. Então. Um empresário, que tem, sempre no íntimo um pouco de espírito de jogo, de espírito de aventura no bom sentido, ele vai em busca, e corre risco e dá em garantia seu patrimônio, em garantia o aval da sua mulher, da sua casa, quer dizer empenha seus bens e, numa economia de mercado isso funciona muito bem. Hoje nós vivemos no Brasil, uma economia totalmente carterizada. Quer dizer, nós temos setores de atividades onde não é permitido o ingresso de novos empresários. Então, a renovação empresarial é bastante dificultada, já que você para ser banqueiro, por exemplo, você tem que ter carta-patente. Você não pode começar, como começou o Sr. Amador Aguiar, com um pequeno banquinho em Marília e se tornar no Bradesco. Você não deve começar com engenho de pinga, como começou a Família Ometto e se tornar o maior produtor de álcool e açúcar do mundo. Você tem que começar grande, e grande é muito difícil começar. Então, esse sistema carterizado, de um lado, estatizado, monopolizado do outro, tem prejudicado tremendamente. Acho que o modelo econômico, na expressão que o ministro Delfim abomina, o modelo econômico entre aspas, brasileiro, se ele não for profundamente acelerado, nós caminharemos para um processo autofágico de crescentes dificuldades, já que o governo está satisfeito com a balança comercial, saldo na balança e redução na inflação. Mas está tomando dinheiro para pagar dívida. Então, realmente nós estamos reduzindo o nível de investimentos no Brasil, com consequências desastrosas em longo prazo.
TV: Luiz. Esse modelo econômico dirigido, banca o jogo da política energética? Resolve? Vai garantir?
LLB – Eu acho que não. Eu acho que a política energética tem caminhado para uma intenção global, eu acredito, bem intencionada, mas muito ao sabor circunstancial. Quer dizer, ao sabor de uma crise no Oriente Médio, ao sabor de boatos, quer dizer, não tem caminhado com uma força de consciência nacional.